quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Franz Kafka Nos Traços de Robert Crumb

O cultuado escritor Franz Kafka (1883-1924) teve como característica falar sobre o homem simples que vive em meio à sociedade contemporânea. Suas mais conhecidas obras contam com personagens e aspectos que mostram a relação do ser humano em relação ao mundo de forma irônica, mas muito realista e que levam em conta experiências pessoais.

Os trabalhos e fatos da vida do tcheco ganham forma e ilustrações em Kafka de Crumb (Editora Desiderata, 184 páginas, R$ 39,90), com textos de David Zane Mairowitz e desenhos do controverso e popular Robert Crumb ­ que esteve na Festa Literária Internacional de Paraty deste ano.

A publicação não pode ser classificada apenas como um livro biográfico e se mantém interessante ao misturar traços de histórias em quadrinhos ao contexto histórico vivido pelo autor. O trabalho de pesquisa realizado por Mairowitz torna os leitores capazes de compreender, verificar e analisar os complicados questionamentos do escritor homenageado.

"Nenhum autor de nossa época, e provavelmente nenhum desde Shakespeare, foi tão mal-interpretado e ignorado", diz em um trecho.

As páginas trazem sua infância em um gueto judeu em Praga, na República Tcheca, passando pela juventude, o relacionamento conturbado com figuras de autoridade (casos do pai e do chefe em repartição pública), as dificuldades em lidar com as mulheres e o momento em que escreveu alguns dos textos mais complexos de todos os tempos. Detalhes como o vegetarianismo e o caos que isso causou na família e a preocupação com acidentes no ambiente de trabalho são revelados.

O fato de ser judeu o influenciou demais. Kafka presenciou tempos em que o nacionalismo tcheco crescia muito em relação a predominância alemã, resultando em ódio quanto a seu povo. Tais complicações fizeram com que sentisse raiva de suas raízes religiosas.

De acordo com Mairowitz: "A maioria dos judeus daquela época (ou de qualquer outra) absorvia a ameaça diária do antissemitismo e a interiorizava. Kafka não escapou dos sentimentos judeus de aversão..."

Vida pessoal e profissional se confundem e é neste momento que suas obras são apresentadas em HQ para o público. Estão presentes versões de A Toca, Na Colônia Penal, O Castelo, O Veredicto, Teatro da 'Natureza' de Oklahoma e Um Artista da Fome.


Não ficam de fora clássicos como O Processo, de 1914, que serve de base para o desenvolvimento da noção conhecida como kafkaniana, além de A Metamorfose, no qual narra as ações de Gregor Samsa quando acorda inesperadamente na forma de um monstruoso inseto.

Eles ganham o traço urbano de Robert Crumb. Com estilo rústico e underground, o ilustrador consegue manter em desenho a densidade encontrada nos textos de Kafka. As histórias são repletas de situações bizarras e que misturam tragédias e momentos engraçados, prato cheio para um Crumb que está acostumado a trabalhar com essa temática.O prefácio é assinado pelo cartunista gaúcho Allan Sieber. Conhecido pelo humor ácido e inteligente, ele reconhece o ótimo produto do livro.

"Desenho e texto encontram uma simbiose perfeita, em que o desenhista não perde personalidade nem compromete a obra do autor com firulas e maneirismos desnecessários. Parece fácil, mas não é. Kafka e Crumb, na verdade, têm muitas coisa em comum", diz. É o que se percebe durante nesta união de universos.

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